Umbanda: religião da caridade e não de dogmas
Por
Arauto de Aruanda
Certa vez fui, juntamente com um amigo, à uma casa de Umbanda Sagrada na zona norte da Grande São Paulo. Assistimos à gira e após seu término meu amigo desejou se inscrever para se tornar filho de santo daquele núcleo umbandista. Como estava junto dele, acompanhei-o em seu cadastro, o qual foi realizado por umas das dirigentes do terreiro e me surpreendi com o que presenciei.
Ao notar que meu amigo usava guias no pescoço ela começou a indagá-lo:
- em que terreiro mandaram você usar essas guias (fios de conta)? Por que você está com três guias no pescoço? Quem te deu permissão para usá-las?
Obtidas as respostas do meu amigo a essas perguntas, a nossa correligionária lhe retrucou:
- na Umbanda nós usamos apenas duas guias: uma quando participamos dos serviços dentro do terreiro e outra quando saímos na rua.
Pelo amor de Oxalá! Quando escutei isso me segurei, até mesmo porque a tal dirigente estava com três fios de conta no pescoço!
Ela tentava corroborar suas afirmações, argumentando que se usamos mais de uma guia (fio de conta) é porque não confiamos nos guias (mentores espirituais), pois se confiássemos uma guia apenas bastaria.
Tal argumento é fraco e poderia ser desconstruído apenas por um único contra-argumento afirmando que devemos usar todos os fios de conta dos guias espirituais para não discriminar nenhum deles, o que também não seria necessariamente verdade, pois não fazê-lo não implica que a pessoa os despreze. O que quero mostrar aqui é que um argumento tão fraco como o segundo pode facilmente desconstruir o primeiro que é mais ridículo ainda!
Se não bastasse isso, ela prosseguiu:
- o que eu estou lhe dizendo é o correto. Se você quer iniciar terá que seguir as coisas corretamente, porque na Umbanda é assim!
Quando escutei isso (me segura meu pai Omolu!), perguntei:
- desculpe-me, eu só estou acompanhando meu amigo e não pude deixar de escutar, mas gostaria de fazer uma pergunta: o que a senhora está dizendo é o correto ou é norma da casa?
Ao que ela replicou:
- o que eu estou ensinando é o correto, porque na Umbanda é assim;
Contestei:
- pois bem, sou médium de Umbanda, conheço várias casas umbandistas e nunca havia escutado isso, até mesmo porque dentro da Umbanda aprendemos que “cada casa mexe a panela à sua maneira”, então não existem normas (fora os princípios umbandistas básicos) que valham para todos os terreiros, sobretudo, considerando que a Umbanda está em constante evolução;
Então, ela respondeu:
- o que eu estou dizendo é o correto para a nossa casa.
Moral da história: a todo instante ela estava ensinando as normas da casa e transmitindo-as como se fossem a prática de todos os terreiros de Umbanda!
Filho de Umbanda aprenda que nossa religião está constantemente passando por transformações, que em cada casa de axé a espiritualidade conduz as coisas da maneira como é preciso ser feito ali, e que na Umbanda não existe um Vaticano para impor suas normas sobre os demais! Não temos papas, nem patriarcas e nem Grão Mestres!
Sou capaz de aceitar as normas da casa da dirigente acima mencionada, mas sou incapaz de aceitar que isso seja uma norma em todas as casas de Umbanda!
A Umbanda é uma religião centralizada principalmente na prática da caridade e não nos dogmas. Sendo assim, menos dogmas e mais prática da caridade, afinal, desta segunda depende nossa evolução espiritual e o progresso da humanidade.
Que Oxalá abençoe a todos!
Nenhum comentário:
Postar um comentário